XXII

Versão 1.0
T. J. Bug, escritor famoso, dirigiu-se à família: “Entrei em bloqueio criativo. Não me sai nada da cabeça.” Mulher e filhos liam o desespero na sua atitude e expressão, mas acolheram-no com um olhar compreensivo. Queriam tentar ajudá-lo, servir de alguma forma de fonte de inspiração. Tratavam-no bem, faziam-lhe as vontades, evitavam os atritos, encorajavam-no com palavras entusiásticas, não lhe cobravam o tempo investido. Por vezes, T. J. sentava-se na sua escrevaninha, onde permanecia algum tempo sem nada escrever, para depois regressar com um olhar taciturno, num ritual de comiseração. Decorreram dias, semanas. A entrega dos próximos era total e incondicional, sem oscilações nem contestações. Um dia fechou-se no seu escritório e lá permaneceu durante horas a fio com o seu laptop. Ao fim de quase um dia, abriu uma gaveta e tirou de lá um maço grosso de folhas impressas. Destrancou a porta e mostrou a obra à família. Eles rejubilaram e abraçaram-no. T. J. sabia que estava a vampirizá-los, mas não lhe causava qualquer remorso.
Versão 1.1
T. J. Bug, escritor famoso, dirigiu-se à família: “Entrei em bloqueio criativo. Não me sai nada da cabeça.” Mulher e filhos liam o desespero na sua atitude e expressão, e deixaram-se contagiar por essa angústia. “Que fazemos agora? Como te podemos ajudar? Com certeza não esperas que vá escrever por ti!”. Estas palavras amargas apenas deixaram-no mais vazio e despojado. Nos dias que se seguiram, todos o tratavam com rispidez, como se a sua inspiração constituísse uma obrigação familiar. Sentia-se diminuído, e isso ia-lhe provocando uma raiva refreada e crescente. Dias, semanas passaram-se, e essa impotência ia-o sufocando lentamente, agudizada pela censura dos seus próximos. Quando sentiu que não aguentava mais, fechou-se no seu escritório e lá permaneceu durante horas a fio com o seu laptop. Escreveu com uma avidez incrível, canalizando toda aquela revolta para o seu enredo. Ao fim de quase um dia, tinha a sua obra pronta. Destrancou a porta e mostrou a obra à família. Eles acenaram em aprovação. Sabiam que estavam a vampirizá-lo, mas não lhes causava qualquer remorso.
1 Comments:
Muito bom!!
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